Revista Constelar Revista Constelar

 

 

 
 
 
ASTROLOGIA NO GLOBO REPÓRTER

O jogo do morde-e-assopra

Fernando Fernandes

 

Apresentação dos resultados da pesquisa da Universidade de Brasília leva Globo Repórter a passar imagem positiva da Astrologia. Contudo, o programa aproveita para reforçar no espectador algumas noções incorretas e velhos preconceitos.

Astrólogos, de uma maneira geral, já se acostumaram a receber da imprensa um tratamento que os coloca numa condição semelhante a de charlatães. Por isso a matéria exibida pela Rede Globo na sexta-feira, 25 de julho de 2004, durante o programa Globo Repórter, provocou reações que variaram da incredulidade à euforia. Foram apresentados os resultados da pesquisa desenvolvida no âmbito da Universidade de Brasília, onde, sob a coordenação do professor Paulo Celso Gomes, o astrólogo Francisco Seabra analisou os mapas de 100 voluntários, sem conhecê-los, e registrou observações que depois foram confrontadas com a percepção dos próprios pesquisados. O índice de acertos, segundo Paulo Celso Gomes, foi em torno de 95%. Ponto para a Astrologia? No que tange à imagem pública de seus praticantes, sem dúvida a resposta é sim, mas é preciso tomar cuidado: apesar de mostrar o excelente trabalho desenvolvido por Francisco Seabra, o programa deixa claro que a foco de interesse não está na competência dos astrólogos, mas sim na possibilidade de sua confirmação objetiva por uma pesquisa acadêmica.

Paulo Celso Gomes, coordenador do experimento. (foto: Helano Stuckert/UnB Agência)

De positivo (e só isso já valeria o programa), o Globo Repórter pela primeira vez pôs no ar uma matéria sobre Astrologia sem aquela irritante trilha sonora de música new age ou de sons "espaciais" que, somados a velhos truques, como o uso de lentes deformantes ou de ângulos inusitados de iluminação, costumam criar um clima espectral para qualquer aparição de astrólogos na TV. O objetivo é provocar um estranhamento, estabelecendo um distanciamento entre público e astrólogo ao projetar sobre este uma imagem folclórica ou risível. Desta vez, não. Francisco Seabra foi entrevistado como uma pessoa comum, sem trilha de efeitos especiais, e mostrado como uma pessoa de bom senso suficiente para criar duas filhas, uma das quais "roubou a cena" ao definir-se como "uma fortaleza bonita e poderosa" (a menina é leonina, é claro!).

Pode parecer irrelevante, mas não é. A mensagem subliminar que os meios de comunicação sempre passaram é que astrólogos são pessoas diferentes. Tanto que são confundidos com "sensitivos" e com "magos" pela maioria dos leigos, para os quais a leitura de um mapa não é fruto de uma técnica, mas sim de alguma forma de clarividência. Por isso, mostrar Francisco Seabra como pai da simpática e espevitada Raíssa pode ter contribuído mais do que se imagina para humanizar a imagem dos praticantes desta profissão tão mal compreendida.

Por outro lado, há sempre o risco de que a abertura de uma brecha na resistência da comunidade acadêmica acabe por incentivar projetos mais discutíveis, como o de transformar a Astrologia num curso superior. Nada contra a presença da Astrologia na universidade, mas sim contra o que pode vir depois: regulamentação, controle da prática da Astrologia por tecnocratas sem envolvimento com a matéria, exclusão de profissionais, reserva de mercado, elitização do ensino - todo o cortejo de mazelas que já ocorreu, enfim, com outras profissões que foram regulamentadas por decreto antes que a massa de seus praticantes tivesse tempo de se organizar.

Voltando ao Globo Repórter: apesar do saldo favorável, aqui e ali o texto dos redatores escorregou em velhos preconceitos e noções errôneas. Constelar fez a seleção dos piores momentos. As citações a seguir são transcrição fiel da locução do programa, seguidas de comentários:

Entre o Céu e a Terra há muito mais do que um imenso vazio. Ao redor de milhões de galáxias, suspeita-se, um mundo infinito e secreto exerce poderes sobre a Humanidade.

Mundo secreto que exerce poderes sobre a Humanidade? Eis aí, sorrateiramente infiltrada, a velha noção de que astrólogos são magos que lidam com forças ocultas.

A energia que equilibra o corpo e harmoniza a mente vem do Universo? Estaria dentro de nós mesmos o remédio para as doenças? A ciência ocidental, que torcia o nariz para esses assuntos, começa a descobrir de que maneira esses fenômenos podem nos ajudar. A começar pela astrologia.

"A ciência ocidental começa a descobrir...". Em outras palavras: agora, que há pesquisas com metodologia científica sobre a Astrologia, já começa a ser possível levá-la a sério. É uma forma indireta de afirmar que o método científico é o único paradigma de validação do conhecimento.

Fundada em 21 de abril de 1962, a UnB - Universidade de Brasília (foto: Arquivo / Agência UnB) tem um Núcleo de Estudos de Fenômenos Paranormais, que realizou a pesquisa de validação da Astrologia. O mapa de fundação da UnB mostra uma conjunção Lua-Netuno em Escorpião em quadratura com Saturno em Aquário, indicando a possibilidade de tornar-se um local de experimentação de fenômenos da área psi.

Mais escorregões do Globo Repórter

Atalhos de Constelar 73 - julho/2004

Consciência inclusiva, amor e preconceito, de Carlos Hollanda
Como identificar o amor no mapa astrológico? | Vênus, a força agregadora | O tabu do individualismo | Restrição: um ato de amor | Odiar, execrar e abominar | Exemplos de pensamento inclusivo em ação

Astrologia no Globo Repórter: o jogo do morde-e-assopra, de Fernando Fernandes
Abertura | Mais escorregões do Globo Repórter | Opiniões dos leitores | O relatório da Universidade de Brasília

Todas as mulheres de Vênus, de Fernando Fernandes
Vênus de Áries a Virgem | Vênus de Libra a Peixes


Anterior | Próxima | Sumário desta edição | Índices

© 1998-2004 Terra do Juremá Comunicação Ltda.