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ASTROLOGIA, HOMEOPATIA E ALQUIMIA

Natureza, Símbolo, Realidade Imaginária

Alexey Dodsworth

 

A falácia do trabalho e da responsabilidade

Tal mudança de um "cosmo sagrado", panteísta, à "monoteização", levou-nos à secularização do trabalho em detrimento do lazer e do prazer. Encarando a si mesmo apenas como "instrumento de progresso" de forma compulsiva, urgente e competitiva, ignorando a importância da criatividade, do bem-estar e do lazer, o homem termina por retirar todo o sentido de sagrado que existe no trabalho. E é a perspectiva do sagrado que confere satisfação pessoal, e não apenas o trabalho em si. Tal perspectiva reflete, ainda, a concepção religiosa ocidental que diz que "a vida é trabalho, a vida é labor e sofrimento". Mesmo em filosofias ditas mais alternativas, a Terra é encarada como "um planeta de expiação e de queima do karma".

Curiosamente, este mesmo homem moderno que corre para ganhar o tempo que nunca tem, ao buscar situações de lazer tenta "matar" o tempo de forma compulsiva - a mesma compulsividade com que aborda seu trabalho. A diversão precisa ser "bem sucedida", porém está frequentemente carregada de culpa e destituída de alegria. E o trabalho, vazio de prazer.

Esta forma de viver está em total desarmonia com a lógica natural segundo a Astrologia: a Casa 6, do labor e do trabalho aplicado ao cotidiano, vem após a Casa 5, do lazer, da diversão, da criatividade e do romance. É mais do que lógico que nossos mais bem-sucedidos trabalhos venham da diversão, mas infelizmente não é assim que o homem tem vivido. Há uma separação bem nítida entre uma coisa e outra, quando na verdade o trabalho deveria ser uma extensão do lazer.

Do mesmo modo vemos como esse problema arquetípico de Casa 5 - Casa 6 afeta a polaridade: nossa visão de Deus (Casa 12) afeta todo o grupo humano (Casa 11).

Ao alienar-se do sagrado e da natureza (externa e interna), o homem moderno está ameaçado de perder a oportunidade de construir sua própria alma e imprimir sentido à própria vida. Ao alienar-se da natureza lúdica, sensual e hedonista de Pan, o homem está arriscado a se tornar um autômato, um escravo da produção.

A pergunta que todos deveríamos nos fazer, é: produzir para quê? Se não há senso de sagrado (Casa 12) e de prazer (Casa 5), não pode haver nem produção eficiente (Casa 6), nem integração com o grupo maior da Humanidade (Casa 11).

A dominação do pensamento ocidental

Os três primeiros mandamentos judaico-cristãos descortinam ao homem uma nova realidade: uma divindade separada do homem. Esta mesma "divindade" teoricamente moldou e elegeu o homem como o único beneficiário das promessas divinas, da glória e da própria Terra. No princípio, a ordem era: "a imagem desta divindade jamais poderá ser reproduzida, deve ser apenas adorada". Psicologicamente falando, todavia, o homem tem necessidade do elemento da imaginação (imagem em ação), o homem tem a necessidade e o direito de simbolizar o seu sentimento de sagrado, e isso se expressa através da arte, da música, da poesia, da literatura e das imagens míticas, simbólicas, folclóricas. Como pode ser visto, mesmo na igreja católica a sutil lei do "não representarás" caiu por terra, porque representar é uma necessidade humana, e as imagens existem, o teatro fervilha, a poesia pede passagem, os mitos reclamam seu direito de expressão.

O próprio mapa astral pode ser encarado como um "Teatro dos Deuses", o nosso script pessoal, a peça que representamos.

O sagrado foi limitado ao conceito que James Hillman chama de "espírito" - os altos picos nevados, distantes, longínquos. Na própria tradição astrológica vemos o sagrado transferido quase totalmente para as Casas 9 e 12, e esta é, ao meu ver, uma grande falha. O Sagrado se manifesta sobretudo na realidade cotidiana. As experiências do sagrado, na forma de manifestações concretas e materiais, tais como bosques, animais e elementos do imaginário, as coisas da alma, são declaradas malignas. Ou seja: a imaginação simbólica foi banida. Pan virou o diabo e passamos a sofrer de PANico.

Uma pintura idealizada de Pã e Psiquê.

Na medida em que esse Deus inatingível das Casas 9 e 12 se tornou a representação simbólica sem rosto do "bem absoluto", coube à natureza humana carregar consigo a projeção do "mal" - o que exprime a implacável inimizade existente entre o mundo patriarcal e a realidade matriarcal da "Grande Mãe", resgatada pelos círculos Wicca. Pois mater, que é matéria, também é mãe ou feminino, a experiência do êxtase sensual, a carne instintiva. A mulher, dentro do pensamento ocidentalizado e sobretudo no pensamento judaico-cristão, tornou-se a instigadora do mal, a perversora do homem. Mas, sutil que é, conseguiu infiltrar-se na mitopoética cristã na forma da Imaculada Virgem Maria...

Poderíamos viajar mais ainda, e concluir que se Deus e a Verdade estão nas casas 9 e 12, o que está nas casas 3 e 6 é o diabo? Ora, afinal o regente das Casas 3 e 6 não é Mercúrio, a equivalência romana do nórdico Loki, o Deus da Mentira?

O problema é que qualquer "imagem de Deus" que se submeta a uma casa específica é uma imagem dividida, não-integral, que desconsidera O Todo. O Sagrado está em todo o mapa, e não apenas num ou noutro aspecto, numa ou noutra casa.

E apesar de estarmos condenando no homem ocidental esta separação do seu lado instintivo, há de se reconhecer a inevitável necessidade de livrar-se do modelo da Grande Mãe. A fim de estabelecer uma personalidade independente, a humanidade teve de se render a um modelo patriarcal único, esquecendo-se dos poderes da realidade da natureza que nos rodeia, "os deuses que também são animais, plantas, pedras, lugares e tempos", como cita Edward Whitmont em seu Psique e Substância. Ele teve que "dominar essa terra" e transformá-la num serviçal do eu. Podemos entender esse processo como a transição necessária de um estado indiferenciado (feminino) até uma atitude mais distinta, mais individualizada (masculino).

A questão emergente agora é que esse movimento tem ultrapassado os limites. Urge agora a busca de uma via de integração, onde a realidade não é masculina ou feminina, mas andrógina, como nos recorda bem a imagem assexuada de Aquarius, símbolo da nova era em que estamos entrando. A atual erupção da bissexualidade pode ser interpretada, sob este ponto de vista, como uma teatralização do androginato arquetípico - e isso também é Sagrado.

Visão herética: a alquimia resgatada

Atalhos de Constelar 02 - agosto/1998

Natureza, Símbolo, Realidade Imaginária, de Alexey Dodsworth
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