João Acuio

A violência é tão fascinante e nossas vidas são tão normais

Imagine agora alguém com Sol e Lua no heróico signo de Áries, conhecido por impor sua vontade e personalidade, ter também forte ênfase em Peixes, o signo da dissolução do ego e da vontade pessoal, além do poderoso Plutão no Descendente. Plutão na soleira da Casa 7 é ter o símbolo da morte e renascimento nas próprias costas. Essa configuração é o próprio Titanic. Aprendi a esperar mas não tenho mais certeza/ agora que estou bem, tão pouca coisa me interessa/ contra minha própria vontade sou teimoso, sincero/ e insisto em ter vontade própria (Lage D'or)

Também é importante dizer que a mulher e o homem reagem de maneiras diferentes a Peixes/Netuno. Netuno está mais afinizado com a natureza feminina. Ou você já viu alguma sereia com a barba por fazer? A experiência netuniana se liga à sabedoria feminina. Ou, como diz Campbell:

A sabedoria feminina é a mulher como doadora de formas. Ela é quem dá a vida às formas e sabe de onde estas provêm. Provêm daquilo que está além do masculino e do feminino; daquilo que está além do ser e do não-ser. Aquilo que ao mesmo tempo é e não é. Nem é nem deixa de ser. Está além de todas as categorias da mente e do pensamento. [Joseph Campbell, O poder do mito, p. 191, Editora Palas Athena, 1997, São Paulo, SP.]

Uma vez, Renato Russo declarou-se pansexual. Peixes está relacionado à dissolução dos limites e os limites começam na sexualidade. Peixes são dois: meninos e meninas.

Quero me encontrar mas não sei onde estou/ Vem comigo procurar um lugar mais calmo/ Longe dessa confusão e dessa gente que não se respeita/ Tenho quase certeza que eu não sou daqui
Acho que gosto de São Paulo/ E gosto de São João/ Gosto de São Francisco/ E São Sebastião/ E eu gosto de meninos e meninas (Meninos e Meninas)

A expressão pisciana de Russo começou muito antes: ao saber, aos 15 anos, que tinha epifiólise, doença rara que ataca os ossos. Ora, os ossos são o símbolo no corpo da estrutura, isto é, Saturno. Quando Netuno encontrava-se no Meio-Céu em quadratura ao Ascendente, ponto que fala do corpo, e Plutão se opunha ao Sol-Lua em Áries, Renato descobriu que não podia andar, ficando dois anos numa cadeira de rodas. Momento que se dedicou a conhecer literatura, estudar inglês e criar no imaginário inúmeras bandas. Aos 17, começou a beber. Este período incubou uma violência artística que veio a explodir logo depois quando Renato formou o Aborto Elétrico. Trânsitos e progressões envolvendo Plutão ou Netuno são inesquecíveis. É quando o destino sorri.

Eu estava me destruindo e, em vez de me matar com um tiro na cabeça, preferi procurar ajuda. Isso vem desde os 17 anos, mas no "V" foi a primeira vez que coloquei na música essas questões. "Montanha Mágica" é sobre isso. Eu era jovem e acabei entrando num beco sem saída.

Isso foi me consumindo, eu ficava deprimido e não sabia o porquê. Achava que o mundo era horrível, igualzinho ao Kurt Cobain [*], nada mais valia a pena. E isso é estranho porque, se eu achar um dia que as coisas não valham a pena, quero estar com a cabeça no lugar, e não com o corpo cheio de toxinas [Folha de São Paulo, 11/10/2001, entrevista a Alexandre Matias, em 1994.].

[*] Kurt Cobain, líder da banda Nirvana, nasceu dia 20 de fevereiro de 1967 às 19:20 em Aberden, Washington. Os mapas de Russo e Cobain são incrivelmente parecidos. Ambos tinham Netuno em Escorpião e Plutão em Virgem. Como também Mercúrio, Quíron e Vênus em Peixes. O Ascendente de Russo é Peixes, o de Cobain é Virgem, signos opostos complementares. Cobain era pisciano. Ambos eram autodestrutivos.

Num primeiro momento o álcool é uma droga netuniana. Baco, deus associado a Peixes, é o deus do vinho. É o êxtase que mora nas uvas. Num segundo momento, encontra-se um cão raivoso na garrafa de whisky. Astrologicamente falando, a face negra de Netuno e os incontroláveis Plutão e Marte envelhecidos por 12 anos. Renato Russo era alcoólatra. Chegou a freqüentar os Alcóolicos Anônimos. A canção Só Por Hoje é desenvolvida sobre o principal lema dos AA.

Só por hoje eu não quero mais chorar/ só por hoje eu espero conseguir/ aceitar o que passou e o que virá/ só por hoje vou me lembrar que sou feliz
/../ só por hoje eu não vou me machucar/ só por hoje eu não quero me esquecer/ que há algumas pouco vinte e quatro horas/ quase joguei minha vida inteira fora (Só Por Hoje)

Russo também fez uso de heroína. V, talvez o álbum mais triste da banda, foi fruto dessa experiência e da notícia de que nele se desenvolvia o HIV.

Sempre precisei de um pouco de atenção/ acho que não sei quem sou/ só sei do que não gosto/ e esses dias tão estranhos/ fica a poeira se escondendo pelos cantos / / Este é o nosso mundo/ o que é demais nunca é o bastante/ E a primeira vez é sempre a última chance/ Ninguém vê onde chegamos: os assassinos estão livres, nós não estamos (O Teatro dos Vampiros)