Revista Constelar Revista Constelar

 

 

 
 
 
ASTROLOGIA E ANTROPOLOGIA

Crenças e tabus: o zodíaco frente à cultura

Carlos Hollanda

 

A cultura e os eixos Gêmeos-Sagitário e Câncer-Capricórnio

Antes de explicar o que propõe o título do capítulo, é preciso deixar claro alguns pontos:

1. A noção de relativismo está implícita no simbolismo do signo de Peixes, o que inclui o relativismo cultural professado pelos antropólogos. Peixes simboliza, entre outras coisas, a percepção de que todas as diferenças de pontos de vista são válidas, cada uma tendo um encadeamento especial que explica suas razões de ser. Ou melhor dizendo, isso significa que, para a ciência Antropologia em sua vertente cultural, a realidade não é definida por um único foco cultural, nem a legitimidade reconhecida por uma cultura é mais evoluída ou mais lógica que a reconhecida por outra. Elas diferem pelo contexto, e esse contexto se explica por si próprio. O antropólogo precisa vivenciar ele mesmo as circunstâncias típicas de cada cultura para poder divisar seus mecanismos e seus porquês sem nunca comparar ou tomar a cultura da qual é originário como referência. Em seu trabalho científico ele explicará, numa linguagem inteligível aos componentes de sua cultura (como um tradutor o faria), o modus operandi de seu objeto de estudo.

Mas esta postura, repito, é com relação à maneira de a ciência Antropologia observar e atuar em relação à cultura. Não à cultura em si.

2. O conceito de separação entre "puro e impuro", apesar de ter conotações claramente virginianas, não faz de Virgem um significador de cultura, como Gêmeos-Sagitário e Capricórnio-Câncer. Na verdade, o criticismo e a busca por organização do caos no simbolismo virginiano se apresenta como uma função subordinada ao conceito de cultura. Para algo ser aproveitado, rejeitado e colocado em seu "devido" lugar, antes é preciso haver uma percepção geral do que é ou não danoso. Mas Virgem não é o significador da construção de uma realidade baseada nas crenças e nas tradições. Virgem representa a classificação do puro ou impuro segundo o que a cultura assim determina. É, sim, o repositório das expectativas no sentido de manter a cultura, digamos, "saudável" ou isenta de contato com o que é potencialmente nocivo. Seu significado e característica, então, está subordinado ao sistema de crenças peculiar de cada cultura, como será explicado mais adiante.

3. Não podemos confundir ideologia com cultura nem com crença popular. Apesar de a ideologia poder ser classificada como um sistema de crenças, ela o é baseada num conhecimento factual, científico ou até numa reflexão filosófica sobre realidade, mas há nela um quê de revolução. A ideologia é formada sob teorias e experimentos, não sendo tão movida por imposição da cultura quanto o comportamento geral da coletividade. Ao contrário, ela costuma ir contra a cultura. Daí o nome "contracultura" aos movimentos dos anos sessenta incentivados, entre outras coisas, pelas obras de Jack Kerouac (foto) ainda na década anterior. Na década de 60 Urano e Plutão estiveram conjuntos em Virgem e Netuno transitava por Escorpião. A contracultura teve seu corolário no Brasil no início dos anos 70 do século XX, em decorrência de movimentos como o tropicalismo, iniciado por Caetano Veloso e Gilberto Gil, mas sua alavancagem se deu mesmo durante a conjunção Urano-Plutão.

Isso poderia levar o analista de ciclos a incorrer no erro de enxergar Virgem e os planetas geracionais como significadores de cultura, pois no decorrer daquela década houve mudanças radicais em nível cultural. Mas aí é que está o erro. A contracultura vai literalmente contra a cultura vigente ou dominante. É um esforço de subversão da ordem ou de alteração do cosmo ordenado da cultura geral. A própria mudança no comportamento sexual feminino, facilitada graças ao surgimento da pílula anticoncepcional, é uma verdadeira revolução cultural, mas não representa um atentado aos pilares da sociedade ocidental: o comércio e o direito civil. Ao contrário, isto pôde ser absorvido pela cultura, transformando-a naquilo que conhecemos hoje. Pôde ser vendido e até transformado em leis que favorecem a indústria beneficiadora desses novos valores, que na verdade são velhos valores retornando ao cotidiano após séculos de proibições religiosas.

O que temos, então, que possa explicar por analogia astrológica tais eventos? Eis uma teoria: a ação coletiva que visa a trazer à tona conteúdos recalcados pela cultura é análoga aos planetas geracionais. Quando eles estão unidos por conjunções esta ação torna-se mais forte, o que caracteriza uma subversão dos valores culturais vigentes. Não importa em que signos estejam.

Mas a contracultura é um movimento que ocorre no seio da própria cultura. Uma modificação interna que se alastra pouco a pouco em função de uma nova mentalidade que questiona os tabus. Até aí, portanto, o que temos não é cultura em si, mas elementos que a alteram, que a subvertem. E, em se tratando do processo de modificação comportamental dos anos 60, Virgem não é um significador de cultura afetado por planetas geracionais. É a conjunção dos mesmos que afeta toda uma noção de realidade. Assim foi com os planetas sociais, Júpiter e Saturno, conjuntos a Urano em Touro, no início da década de 40, quando da entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial. Só que a bomba atômica explodiu no Japão quando Urano já estava em Gêmeos e Saturno em Câncer, signos que neste ensaio defendo como sendo significadores principais do conceito de cultura. Este evento alterou inacreditavelmente quaisquer padrões culturais existentes até então. E a alteração cultural dali decorrente não tem paralelos, nem quando se fala das posteriores guerras dos EUA contra o Vietnã, Coréia, ou da Inglaterra contra a Argentina, na questão da Ilhas Malvinas.

Mas se o leitor ainda não se convenceu, sugiro dar uma olhada nas posições dos geracionais durante a formação da contracultura. Urano e Júpiter, em 1955, estavam conjuntos em Câncer. Justamente a parte média da década em que os beatniks deram início ao processo de fermentação intelectual que iria alterar profundamente o comportamento do mundo ocidental. Urano ficou em Câncer de meados de 1949 até agosto de 1955.

Observem também o momento da quebra da Bolsa de Nova Iorque, em 24 de outubro de 1929. Ali tínhamos Plutão em Câncer, mas sem aspectos vindos de planetas localizados no eixo Gêmeos-Sagitário. Acontece que Júpiter e Saturno já estavam para formar uma oposição justamente neste eixo. Os poucos graus que faltavam para tanto podem ser desprezados em função dos eventos que são análogos a esta oposição, tal é a força que este eixo tem sobre a idéia de cultura que explicarei mais adiante.

Os reflexos da crise de 29 puderam ser sentidos com veemência ao longo da década de 30, especialmente em seu início, quando foram formados núcleos de oposição à democracia em vários países europeus, o que resultou no fascismo e no nazismo. No Brasil, Getúlio Vargas ascende ao poder e também ocorre a Revolução Constitucionalista de 32 no Estado de São Paulo, opondo-se ao governo Vargas. No mesmo ano, as mulheres adquiriram direito ao voto no Brasil. Curiosamente, de 1931 até a primeira metade de 1932, Plutão e Saturno estiveram em oposição no eixo Câncer-Capricórnio, com Júpiter conjunto a Plutão em 1931.

Isso tudo indica, senão um processo drástico de mudanças na mentalidade vigente, pelo menos um impulso que reverte a mentalidade a respeito das instituições que mantêm um universo cultural estável. Mas agora vejamos o porquê de serem estes eixos considerados como significadores primários de cultura. Assim entenderemos melhor as associações feitas nos últimos parágrafos.

Os significadores de cultura

1 - Introdução
2 - A cultura e a baba que escorre da boca
3 - Astrologia: tão ambígua quanto um sapo
4 - Os significadores astrológicos dependem do contexto cultural
5 - A relação da cultura com símbolos zodiacais
6 - A cultura e os eixos Gêmeos-Sagitário e Câncer-Capricórnio
7 - Os significadores de cultura
8 - Placebos, crenças, sistemas peritos e o cachorro de Pavlov
9 - Reflexo Condicionado: o Homem é muito mais passível que os animais
10 - A oposição entre Plutão e Saturno no eixo Gêmeos-Sagitário
11 - O ser humano como um ator múltiplo, mas inconsciente
12 - Escorpião, o Senhor dos Tabus

Anterior | Próxima | Sumário desta edição | Índices

© 1998-2004 Terra do Juremá Comunicação Ltda.