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PLUTÃO, HADES E DIONÍSIO

Loucura e Despedaçamento

Marcelo Cronos Brasil

 
O simbolismo de Plutão expressa os mistérios do submundo do deus mitológico Hades, mas também fala de loucura, êxtase, aniquilamento e da violência dos rituais de passagem do deus Dionísio.

Minha concepção sobre o Plutão astrológico mudou completamente quando cheguei à conclusão de que Hades e Dionísio são a expressão da mesma 'força'.

Falar de Dionísio não é algo fácil. Dionísio não se expressa pela via da razão, da mente, do ego, ou até mesmo da consciência. Em meu texto incluído no livro Astrologia para um Novo Ser, escrevi algo sobre a grande mutação genética que é capaz de colocar o homem em outros níveis de consciência. De fato, esse era um tema que vinha caminhando entre diversas escolas de magia na época. E esse salto no abismo de transformação física em mudança de estados de consciência estava me dando os primeiros momentos de encontro com Dionísio. Tanto que, no livro, digo que Dionísio é o décimo-terceiro deus, aquele que aparece quando completamos a jornada do herói na travessia das doze portas. Porém, o raciocínio não estava muito bem sedimentado, já que Dionísio não é um criador de consciência.

Não há como conhecer Dionísio sem entrar em sua dança. Ele tem diversas semelhanças com Shiva e existe até um excelente livro a respeito. Dionísio é a figura do Sol Negro. Existem sistematicamente três deuses greco-romanos associados ao Sol Negro: Baco, Plutão e Saturno. Essas três figuras tem interessantes relações. E em toda mitologia onde se manifesta o solar, o Sol Negro se faz presente. No final de 2003 aconteceu um eclipse solar, a morte do Sol, em Sagitário. Naquele momento tivemos dois Sóis Negros no céu: o próprio eclipse e Plutão. Assim como no caso de Lilith, que aparece duplamente no eclipse lunar.

Entrar na dança de Dionísio é terrível. É o deus (ou, em termos mais junguianos, um arquétipo) mais complexo que já se manifestou para a humanidade. Dionísio é o deus estrangeiro, aquele que por onde for não está em seu lar e não se sabe de onde veio. Dionísio e suas panteras e leopardos, senhor das sombras, o rei do mundo dos mortos andando sobre a terra. Dionísio tem seu grande poder no sangue da terra, o vinho. Sempre com sua taça, que lembra a taça do Plutão astrológico. O vinho foi proibido no Islã, por ser sinônimo de confusão. E é, na mística islâmica, o termo utilizado para a experiência divina. E essas palavras dizem absolutamente tudo sobre a experiência dionisíaca, a confusão, o caos, a perda de controle e, ao mesmo tempo, o êxtase divino, onde somos um com o Uno, sem diferença.

Dionísio é o senhor da agonia e do êxtase. Leva à experiência narcísea, ao mergulho incontrolado na própria imagem. A experiência do espelho é contemplar o ser real, aquele que está do outro lado, o reflexo, o verdadeiro. Dionísio leva isso para a confusão, para o mergulho procurando todo o êxtase, o completo abandono, a dor final no desespero do despertar pela via errônea. E assim o faz com toda a sedução, sem o nosso controle. Acabamos por nos perder em nossas máscaras, que são absolutos atributos dos cultos de Dionísio, Ártemis e Hécate. O teatro grego é fruto da iniciação de Dionísio, onde todos colocam máscaras iguais e se perdem na mania , na possessão divina. Dionísio é um deus que cavalga. Ele leva a experimentar a loucura, o despedaçar, o desaparecer. A tragédia grega como expressão dionisíaca, a vida sendo a tragédia.

Os cultos de Ártemis e de Dionísio são relacionados. Em alguns lugares de culto, o ritual começava no tempo da deusa e terminava na do deus. Dionísio é o deus dos espantalhos, o senhor das máscaras. Em sua iniciação, o iniciando se deparava com diversas máscaras penduradas, como que sem rostos por trás delas. Máscaras com olhares terríveis, como o das Górgonas. No mundo infernal, Cérbero impedia a entrada no Hades. A face da Górgona, controlada por Perséfone, evitava a fuga. Dionísio é aquele que brinca com a máscara, que as dá e as tira. O deus da impessoalidade completa.

Quando se diz que na experiência dos trânsitos de Plutão existe um 'vazio', o termo é completamente incorreto. Dionísio é o deus da inconsciência. Dos estados de inconsciência. Dos estados alterados de (in)consciência. Ele é a variação oposta da experiência solar. É o inimigo do Sol, de Apolo, sendo seu concorrente para receber o trono de Zeus e, claro, da consciência apolínea, luminosa e esclarecedora. Quando Plutão está causando sua confusão, seu holocausto, está se alimentando da consciência, transitando informações para o ego do inconsciente, que é o Sol Negro. São os estados de morte. É o simbolismo do Arcano XIII, o transitar entre mundos, entre as deusas da morte e do sexo. Dionísio domina as mulheres e as leva em surtos de loucura e prazer absoluto. A passagem entre Hades e Dionísio é a morte. É assim que entendo esse arcano. Até a Morte, temos Hades, os mistérios do outro mundo, do incompreendido. Depois do arcano da Morte, temos Dionísio, o mistério desse mundo. Fazer a passagem, via a entrega do Enforcado. O sentido do sacrifício do Sol e o nascimento do Sol Negro.

Violentos ritos de passagem

Plutão, da luz ao aniquilamento

Abertura
Crise e renovação para a humanidade, de Tereza Kawall
Em Sagitário, mais crise que renovação, de Fernando Fernandes
Loucura e Despedaçamento, de Marcelo Cronos Brasil
Plutão na casa das realizações profissionais, de Flavia Ribeiro de Melo

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Relacionamentos plutonianos, de Fernando Fernandes
Plutão em Sagitário e agorafobia, de Angela Schnoor


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