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MARIA CLARA MACHADO

A ariana que inventou Pluft, o Fantasminha

Fernando Fernandes

 
Pouca gente conseguiu tratar com tanto respeito e tanta intimidade a fantasia infantil como Maria Clara Machado. Desenho: criança de 5 anos, após ver peça de Maria Clara na escola.

Com o ímpeto de Áries e a fantasia de Netuno, Maria Clara Machado trouxe uma explosão criativa para o teatro infantil.

Nascida em 3 de abril de 1921, em Belo Horizonte, Maria Clara cresceu num ambiente de muito estímulo intelectual. Aos quatro anos veio com toda a família para o bairro de Ipanema, no Rio, onde seu pai, o escritor Aníbal Machado, promovia freqüentes saraus em que era comum a presença de artistas e intelectuais como Carlos Drummond de Andrade.

Entre 1949 e 1951, Maria Clara estudou teatro e dança em Paris e Londres, depois de ganhar bolsas do governo francês e da Unesco. De volta ao Brasil, começou a trabalhar como enfermeira no Patronato da Gávea, em 1951. O contato com a infância levou-a ao projeto de montar um teatro para as crianças das comunidades da região. A idéia inicial evoluiu para o Tablado, grupo de teatro amador e escola de formação de atores que, nos 50 anos seguintes, desempenharia um papel de importância inestimável na história do teatro brasileiro. Por ali passariam mais de cinco mil estudantes, alguns dos quais destinados ao estrelato nos palcos, no cinema e na TV, como Rubens Corrêa e Ivan de Albuquerque (que depois abririam o Teatro do Rio e o Teatro Ipanema), Marieta Severo, Malu Mader, Cláudia Abreu, Miguel Falabella, Louise Cardoso e tantos outros.

Falta, para termos um mapa mais acurado de Maria Clara Machado, o horário preciso do nascimento. Mesmo na ausência deste dado, muito podemos compreender desta grande ariana pela análise de sua carta solar, calculada para o horário convencional do meio-dia.

Para analisar o mapa de Maria Clara, tomaremos como ponto de partida uma entrevista com o ator, produtor teatral e professor Márcio Luiz, um dos milhares de ex-alunos do Tablado. Márcio, profissional há trinta anos, trabalhou num grande número de espetáculos no Rio de Janeiro, sendo que o mais surpreendente foi uma montagem inédita da Valsa nº 6, de Nelson Rodrigues. Nelson havia escrito a peça, que é um monólogo dificílimo, para ser montada pela própria irmã, no início dos anos 60. O espetáculo, severamente atacado pela crítica, ficou apenas um dia em cartaz, e seu autor jamais permitiu que fosse remontado. Só abriu mão da proibição quando conheceu o projeto de Márcio Luiz, em 1979. Em 1982 Márcio criou sua própria escola, o Teatro-Vida, cuja metodologia baseava-se no uso de técnicas de improvisação para tematizar situações do cotidiano. Em 1992 radicou-se na Itália e implantou por lá um núcleo de teatro-debate, com atores locais. Agora, de volta ao Brasil, Márcio prestou este depoimento a Constelar, que vale também como uma carinhosa homenagem a Maria Clara Machado.

Um depoimento revelador

MÁRCIO LUIZ - Entrei no Tablado no início dos anos setenta. Acho que tinha uns 14 anos na época. O curso da Maria Clara, apesar de livre, estava em muita evidência e era muito disputado. Uma professora da minha escola, que era profissional de teatro, é que me levou para lá. Meu primeiro contato com a Maria Clara foi num curso de férias que tinha aulas diárias. Pra mim, as aulas com Maria Clara deram a impressão de que eu estava entrando num mundo novo, bonito e misterioso.

CONSTELAR - Você chegou a trabalhar em alguma montagem do Tablado?

MÁRCIO - Não cheguei a participar das montagens do Tablado porque os atores não eram remunerados e eu precisava de grana para pagar o próprio curso. Então, fui trabalhar num grupo de teatro infantil profissional e usava o dinheiro para pagar o curso do Tablado. Anos depois trabalhei como ator numa montagem do Diamante do Grão-Mogol, dirigido pelo Wolf Maia, acho que no Teatro Vannucci. Foi a única chance que tive de ver uma montagem de texto da Maria Clara do ponto de vista do palco, e a química com a platéia realmente funcionava, especialmente entre os pré-adolescentes. Os textos dela têm muito apelo exatamente para esta faixa etária que fica meio desatendida, a faixa da criança mais crescidinha, quase pré-adolescente. Mas os menorezinhos também reagiam muito bem.

Quando jovem, Maria Clara tentou a carreira de atriz antes de descobrir-se como dramaturga e diretora.

CONSTELAR - Quem estudava no Tablado naquela época?

MÁRCIO - No meu tempo, estudavam lá a Lupe Gigliotti, irmã do Chico Anísio, o Carlos Wilson, a Louise Cardoso, a Sura Berditchevski, o Wolf Maia, o Paulo Reis, o Davi Pinheiro, que fez Hoje é Dia de Rock, um monte de gente que hoje está aí em atividade.

CONSTELAR - A Louise Cardoso também começou lá?

MÁRCIO - Acho que sim, ela devia ser ligeiramente mais velha que eu, tinha uns 15 ou 16 anos.

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