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JARDS MACALÉ & WALLY SALOMÃO

Vapor Barato

João Acuio

 

Vapor Barato, de Jards Macalé e do recém-falecido poeta Wally Salomão, serviu como fundo musical para dois difíceis momentos da história brasileira - de exílio forçado ou voluntário - e ambos com a marca de Plutão.

Em dezembro de 1971 é lançado o disco Gal: Fa-Tal, a Todo Vapor. Com os tropicalistas Caetano Veloso e Gilberto Gil no exílio, isto é, em Londres, Gal Costa se transformara na voz deles e de outros "estrangeiros" no Brasil. E é com este disco que Vapor Barato, de Waly Salomão e Jards Macalé, na voz de Gal, se torna uma espécie de "olha, aqui tá todo mundo muito vivo". Embora revelando um coração cansado.

A ditadura militar corria solta no Brasil. Assim como em outros países da América Latina. O Ato Inconstitucional nº 5, o AI-5, que cerceara os direitos políticos e a liberdade de imprensa, comemorava três aninhos (13 de dezembro de 1968). Filhos do Brasil ou morriam misteriosamente nos subterrâneos do regime ou foram ou eram "convidados" a se retirar do país. Vapor Barato era uma espécie de recado para os generais e um cartão-postal além-mar:

Oh, sim, estou tão cansado
Mas não pra dizer que eu não acredito mais em você
Com minhas calças vermelhas, meu casaco de general
Cheio de anéis, eu vou descendo por todas as ruas
E vou tomar aquele velho navio
Eu não preciso de muito dinheiro
E não me importa, Honey
Baby, baby, honey baby...

Oh, sim, eu estou tão cansado
Mas não pra dizer que estou indo embora
Talvez, eu volte, um dia eu volto
Mas eu quero esquecê-la, eu preciso
Oh, minha grande, oh, minha pequena
Oh, minha grande, minha pequena obsessão
Eu vou embora naquele velho navio
E não me importa, honey,
Baby, baby, honey baby...

Vale lembrar que os militares tomaram o poder em 1964 quando Plutão escurecia a luz do Brasil ao se aproximar do Astro-Rei. O AI-5 foi instituído em 1968 quando o mesmo Senhor dos Infernos fez aspecto aplicativo a Mercúrio, isto é, a todos aqueles que fazem às vezes da Voz da nação. Com a mordaça ainda muito apertada, Vapor Barato é lançado já com Plutão no começo de Libra, isto é, quadrando Urano-Netuno e num aspecto separativo em relação a Mercúrio do Independência ou Morte.

O Vapor Barato no Grito do Ipiranga - Os planetas do círculo externo mostram o céu do início de dezembro de 1971 afetando o mapa da Independência do Brasil (planetas no círculo interno).

Ao casar os mapas do Grito do Ipiranga com o do lançamento da canção, o Nodo Norte em Aquário do Vapor mira na casa 12 do Grito, a do exílio e a do cárcere. Saturno, conjunto a Lua-Júpiter do Brasil, anuncia os anos de chumbo que a família brasileira teria que suportar por toda a década de 70. Saturno pesando dentro da própria casa: Brasil, ame-o ou deixe-o. Netuno se opõe a Lua-Júpiter, sugerindo que a ordem era relaxar, esquecer, sonhar com o milagre econômico. Netuno é o regente da casa 2, a dos recursos. E Netuno, quando não inspira, ilude. E, por fim, Júpiter em Sagitário, mais de 180 graus longe de seu lar. Tão distante quanto Londres.

(...) eu vou descendo por todas as ruas
E vou tomar aquele velho navio

Em síntese, Saturno na 4 e Júpiter na 10 podem ser vistos como Saturno - o Hannibal Leckter - devorando o direito de ir e vir representado por Júpiter, enquanto este caminhava no estrangeiro. No começo de 1972, Caetano volta de Londres.

Talvez eu volte, um dia eu volto

E assim, Vapor Barato se tornou um hino da época que começara a ver seus filhos retornarem para casa, já que não restou outra coisa senão o exílio.

O Vapor Barato renasce 24 anos depois


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