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ASTROLOGIA E ANTROPOLOGIA

Crenças e tabus: o zodíaco frente à cultura

Carlos Hollanda

 

Reflexo Condicionado: o Homem é muito mais passível que os animais

A coisa vai além dos Sistemas Peritos. Graças à capacidade de atribuir símbolos à realidade circundante, o Homem cria respostas orgânicas compatíveis com aquilo que sua linguagem e sua mente aprenderam a decodificar como sinais de atração, repulsa, fome, humor etc. Foi Ivan Pavlov, prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia em 1904, quem descobriu o chamado reflexo condicionado . A mesma atitude mental que "comprova" um estímulo sob determinadas condições acaba criando uma resposta orgânica de acordo com esse estímulo. Com o ser humano o processo condicionante é ainda mais decisivo graças à linguagem e à cultura. Nós atribuímos significados a idéias e coisas não perceptíveis aos cinco sentidos físicos. Assim, uma melodia pode nos fazer sentir alegria e elevar a taxa de endorfina do organismo, se nosso sistema nervoso tiver sido condicionado para tanto. De fato, nossas próprias orientações culturais chegam a alterar o comportamento do organismo, como no caso do nojo.

Pavlov (foto) definiu o reflexo condicionado como:

"uma conexão nervosa temporária entre um dos inumeráveis fatores do ambiente e uma atividade bem determinada do organismo."

A experiência clássica de Pavlov é aquela do cão, a campainha e a salivação à vista de um pedaço de carne. Sempre que apresentamos ao cão um pedaço de carne, a visão da carne e sua olfação provocam salivação no animal. Se tocarmos uma campainha, qual o efeito sobre o animal? Uma reação de orientação. Ele simplesmente olha, vira a cabeça para ver de onde vem aquele estímulo sonoro.
Se tocarmos a campainha e em seguida mostrarmos a carne, dando-a ao cão, e fizermos isso repetidamente, depois de certo número de vezes o simples tocar da campainha provoca salivação no animal, preparando o seu aparelho digestivo para receber a carne. A campainha torna-se um sinal da carne que virá depois. Todo o organismo do animal reage como se a carne já estivesse presente, com salivação, secreção digestiva, motricidade digestiva etc. Um estímulo meramente sonoro, que nada tem a ver com a alimentação, passa a ser capaz de provocar alterações digestivas.

Os pesquisadores Júlio Rocha do Amaral e Renato Sabbatini dispuseram na Internet (http://www.epub.org.br/cm/n09/mente/pavlov.htm) e de forma bastante didática uma explicação sobre o fato de o reflexo condicionado ser mais contudente no ser humano:

No homem existe ainda algo importante a ser considerado. Segundo Pavlov, nos animais existe apenas o que ele chamava de primeiro sistema de sinais da realidade. Trata-se dos sistemas do cérebro que recebem e analisam os estímulos que vêm de fora e de dentro do organismo (por exemplo, sons, luzes, nível de CO2 no sangue, movimentos intestinais etc.).

No ser humano, além desse primeiro sistema de sinais, existe um segundo sistema, o da linguagem, que aumenta as possibilidades de condicionamento. Para o ser humano, a palavra pode ser um estímulo tão real, tão eficaz, tão capaz de nos mobilizar como qualquer estímulo concreto, e, às vezes, até mais. Além disso, o fato da palavra ser simbólica, ser uma abstração, permite que o estímulo condicionado seja generalizável.

Um exemplo? Se condicionarmos um homem dando-lhe choques na mão após ouvir a palavra campainha, haverá reação de defesa com retirada da mão. Depois de algum tempo, ao ouvir a palavra campainha, em seu idioma natal ou em algum outro que ele entenda, assim como ao ver uma campainha, real ou em foto o homem terá a mesma reação de retirada da mão. Por quê? Porque o homem não foi condicionado a um conjunto de sons, como foi o caso do cão, e sim a uma abstração, a idéia da campainha.

Outro exemplo de experiência de condicionamento em seres humanos: dá-se choque na mão de um sujeito após ele ouvir a palavra caminho, provocando retirada da sua mão. Depois de algum tempo, ouvindo a palavra caminho, esta pessoa retira a mão, fazendo o mesmo, também, ao ouvir sinônimos: estrada, via, rota etc.

Até o sentimento de atração e de repulsa, cujo significador planetário é Vênus, é subordinado ao sistema de crenças de uma sociedade. Por mais individual que este sentimento possa parecer, ele tem raízes na programação que a cultura representa. As formas físicas e os conceitos de beleza têm um padrão que é complementado com uma ou outra particularidades que os indivíduos buscam. Para exemplificarmos isso basta compararmos o padrão de beleza feminina norte-americano com o brasileiro. A beleza da mulher norte-americana é condicionada pela preferência masculina dos seios fartos, enquanto a da brasileira é condicionada pela apreciação das nádegas volumosas e bem torneadas. Se a mulher é morena, loura, alta, baixa, se se veste de um jeito ou de outro, é uma questão de subculturas e preferências individuais, mas o padrão de beleza é imposto a todas. Esta é a cultura geral em ação.

Também já vimos nos parágrafos anteriores que Escorpião não é tanto o signo do sexo e da morte, mas sim um signo envolvido com os tabus. Note-se que não falo de pessoas escorpianas (Sol em Escorpião), mas sim de um processo coletivo simbolizado por este signo.

Ainda quanto ao sistema de crenças e ocorrências factuais devidas à programação mental: já vimos que em todas as culturas existem tabus. Por mais diferentes que sejam as culturas entre si, a morte sempre é um tabu, o sexo também. Aquilo que é proibido - ou aquilo que pode, de algum modo, ameaçar a vida ou sua continuidade - precisa ser transformado em algo conhecido e, até certo ponto, digamos, "controlável". Pode-se perguntar: "Mas como assim, controlar a morte?". Na verdade não é controle da morte em si, mas do processo que a coloca em seu devido lugar na "realidade" cultural de um povo, isto é, seu cosmos, seu universo.

Alguns povos lidam com a morte enterrando os falecidos, enquanto outros realizam rituais crematórios. Em alguns locais da Ásia os cadáveres são deixados para serem devorados por abutres. Algumas tribos sul-americanas colocam os mortos em urnas, com o formato de ânforas ou jarros, em posição fetal. Os egípcios mumificavam os mortos. São milhares de exemplos, mas todos eles identificam um lugar específico para a morte.

O vivo que rompe algum destes tabus pode ou ser considerado morto por alguns povos (mesmo não morrendo de fato) ou ser excluído devido ao temor de que seu "estado impuro" possa atrair a morte. Há casos de tribos em que estes indivíduos, sem perceber, induziram circunstâncias que aumentassem as chances de morte. E eles morreram graças à sugestão! Mais uma vez: isso ocorre devido à poderosa introjeção da cultura na mentalidade individual. "Aquele que faz isso ou aquilo morre. Então eu devo morrer" - é a cultura de um povo falando através de um indivíduo e fazendo com que ele torne realidade concreta o que é real apenas na mente.

A cultura também se move, isto é, ela é dinâmica e se adapta com o tempo. Ela evolui mais ou menos depressa, de acordo com sua capacidade de assimilação. Ainda assim, quando digo "evolui", não me refiro a tornar-se melhor nos termos da referência de culturas que se acreditam mais civilizadas. Refiro-me à capacidade de cada cultura de recriar seus modelos e parâmetros através da criação de conceitos e referenciais próprios ou externos.

Falei anteriormente sobre a natureza da transmissão de elementos culturais e sobre o caráter geminiano da noção de cultura, mas não falei até que ponto é crucial a questão do pensamento transmitido (da perspectiva da mente conceitual), que é análogo a este símbolo. Particularidade que é oposta à mente global ou intuitiva que se refere às crenças, em Sagitário. Gêmeos e Mercúrio, seu regente, como significadores da mente, também figuram como codificadores do sistema de crenças, haja vista a forma como atua a linguagem no sistema de referenciais humanos. Criamos vocábulos para designarmos as realidades percebidas. Até o momento em que um vocábulo tenha surgido numa cultura, os indivíduos que a compõem não agem ou percebem segundo aquela realidade. Ou melhor, aquela coisa, situação, sensação ou percepção que o vocábulo define simplesmente não existia até aquele momento no mundo daquelas pessoas. Talvez até existisse em potencial, mas não era distingüível o suficiente.

A oposição entre Plutão e Saturno no eixo Gêmeos-Sagitário

1 - Introdução
2 - A cultura e a baba que escorre da boca
3 - Astrologia: tão ambígua quanto um sapo
4 - Os significadores astrológicos dependem do contexto cultural
5 - A relação da cultura com símbolos zodiacais
6 - A cultura e os eixos Gêmeos-Sagitário e Câncer-Capricórnio
7 - Os significadores de cultura
8 - Placebos, crenças, sistemas peritos e o cachorro de Pavlov
9 - Reflexo Condicionado: o Homem é muito mais passível que os animais
10 - A oposição entre Plutão e Saturno no eixo Gêmeos-Sagitário
11 - O ser humano como um ator múltiplo, mas inconsciente
12 - Escorpião, o Senhor dos Tabus

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