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ASTROLOGIA E ANTROPOLOGIA

Crenças e tabus: o zodíaco frente à cultura

Carlos Hollanda

 

A visão de mundo de cada povo é determinada por sua cultura. E cada cultura constrói um processo simbólico diferente, o que relativiza os significados astrológicos.

Quando se usa o termo "cultura", quase automaticamente as pessoas dão-lhe um significado restrito de "refinamento intelectual, de hábitos, modos ou gostos", além de uma grande gama de conhecimentos legitimados socialmente. Na verdade, a cultura não é um atributo restrito a pessoas de grande erudição ou de complicada parafernália vocabular. O conceito de cultura, na acepção antropológica, pode ser resumido como o conjunto complexo dos códigos e padrões que regulam a ação humana individual e coletiva. Em outras palavras, todos os indivíduos têm cultura, pois todos tiveram algum tipo de relacionamento com a sociedade na qual tiveram origem. Os códigos comportamentais de cada grupo social estão implantados, ou melhor, entranhados, na mente de seus componentes.

Podemos fazer a seguinte analogia: a cultura é como um programa de computador, sendo o software nossas crenças e valores sociais, inserido em nosso hardware (o organismo físico) que regula as ações e comportamentos segundo um padrão estabelecido e fora do qual não há resposta codificada. Por exemplo: se num software construído especialmente para a edição de textos estivermos tentando usar um dispositivo para desenhar à mão livre, fatalmente não conseguiremos realizar nosso intento. O programa ou não responderá aos comandos ou poderá interromper por completo suas operações. Isso ocorre porque os comandos dados estão fora do quadro de referências para o qual o programa foi criado. Ele, então, rejeita as operações solicitadas.

Nos grupos sociais ocorre algo semelhante. Se uma atitude que não se encaixa na cultura daquele grupo está muito evidente, é provável que o grupo rejeite o perpetrador da atitude ou o condene a algum tipo de punição. Aquela cultura não tem um quadro de expectativas capaz de assimilar tal ação fora dos padrões, por isso a considera perniciosa, capaz de atentar contra a ordem que mantém o senso de realidade (cosmo - universo criado e ordenado) do grupo social.

Por exemplo, dentro de um hospital a morte é uma rotina para a qual certos procedimentos são comuns. Eles servem para amortecer o impacto que a morte causa no sistema de percepção dos componentes daquela cultura. Entretanto, se ocorre um assassinato de um funcionário que transita pelos corredores, as reações dos outros funcionários serão de pânico, surpresa ou comoção.

A explicação está no fato de que tal evento não está dentro do código de circunstâncias previstos na cultura daquele grupo social. Tal tipo de morte não é considerada uma "morte de hospital", isto é, não ocorre segundo o conjunto de normas que admite a morte como rotina. Está fora das expectativas. É um elemento imprevisível e, portanto, passível de causar desestruturação da noção de realidade daquele grupo. Em outras palavras, é o caos que se apodera da ordem, do universo previsível.

Pela analogia, Urano é significador de pessoas, eventos, objetos e circunstâncias para os quais a sociedade não tem, a princípio, um conjunto de expectativas capazes de neutralizar ou atenuar seu impacto. O símbolo contraria tudo o que está dentro de um escopo tratado como normalidade. No entanto, a mesma coisa que para um determinado grupo seria contraditória, pode ser absolutamente normal para um segundo grupo, isto é, pode estar dentro de seu sistema de expectativas de comportamento. A mesma concepção se estende para os símbolos de Netuno e de Plutão, quando vistos sob o prisma da dificuldade ou até impossibilidade de controle sobre algumas de suas manifestações correlatas: a desagregação contínua e imperceptível (Netuno) das estruturas sociais e a morte (Plutão).

Teoriza-se que a cultura surgiu em vista da necessidade humana de sobrevivência ante um mundo hostil. O Homem desenvolveu-se e proliferou em função do aprendizado cultivado em cada sociedade. O acúmulo e a transmissão de conhecimentos e experiências foram criando subsídios para uma vida mais confortável, garantindo a sobrevivência em meio às dificuldades. Em conseqüência, cada cultura se autojustifica e dá legitimidade a seu sistema excluindo quaisquer outros, pois tudo aquilo que está fora dela parece-lhe atentar contra a continuidade da existência (seu cosmo particular). A cultura, portanto, é também um sistema de garantia da vida. Desestruturar esse sistema é aproximar-se da destruição da vida. Eis aí um dos tabus mais comuns da humanidade.

A cultura e a baba que escorre da boca

1 - Introdução
2 - A cultura e a baba que escorre da boca
3 - Astrologia: tão ambígua quanto um sapo
4 - Os significadores astrológicos dependem do contexto cultural
5 - A relação da cultura com símbolos zodiacais
6 - A cultura e os eixos Gêmeos-Sagitário e Câncer-Capricórnio
7 - Os significadores de cultura
8 - Placebos, crenças, sistemas peritos e o cachorro de Pavlov
9 - Reflexo Condicionado: o Homem é muito mais passível que os animais
10 - A oposição entre Plutão e Saturno no eixo Gêmeos-Sagitário
11 - O ser humano como um ator múltiplo, mas inconsciente
12 - Escorpião, o Senhor dos Tabus

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